Confira os posicionamentos das candidaturas sobre Mobilidade ativa, segurança viária, transporte público, poluição ambiental, participação, combate às desigualdades e justiça social
A Rede Mobilidade e Clima avaliou as propostas para a mobilidade urbana contidas nos planos de governo das candidaturas à Prefeitura de São Paulo. Na análise, buscamos semelhança com as propostas da sociedade civil contidas na Agenda Propositiva para a Cidade de São Paulo: Mobilidade e Clima. Elas estão divididas em sete grandes temas: política urbana; saúde e meio ambiente; segurança viária; justiça social; gestão e participação; mobilidade a pé; mobilidade por bicicleta e transporte público.
Todos os documentos analisados foram baixados diretamente no site do Tribunal Superior Eleitoral antes do dia 30 de setembro e estão disponíveis nesta pasta. Em linhas gerais, o que se percebe é que as candidaturas deram bastante atenção à melhoria no transporte público e redução das desigualdades na cidade, apesar de nem todos trazerem propostas concretas para lidar com essas questões.
Conforme pode ser visto nos infográficos, quanto mais as ações propostas pelas candidaturas se mostram próximas das ações solicitadas pela sociedade civil na Agenda Propositiva para a Cidade de São Paulo, maior a “temperatura” no infográfico. São usadas diferentes tons de vermelho para indicar se as propostas estão “quentes”, “mornas” ou “frias”. Ainda há a possibilidade de marcar temperatura “abaixo de zero”, quando uma proposta representa retrocessos em relação às demandas da sociedade civil. Confira neste post os detalhes da metodologia e neste, um resumo da avaliação de cada candidatura.
Resumo das propostas por tema
A seguir, analisamos como cada tema tem sido abordado pelos programas de governo:
Política Urbana
O planejamento segregado e centralizado da cidade de São Paulo causa várias externalidades negativas para sua população. As propostas que buscam repensar o uso e ocupação do solo, descentralizando ativos, serviços e infraestrutura receberam pontuação mais altas. Tatto, Boulos e Helou propuseram em seus planos de governo diminuir distâncias, levando moradias ao centro e trabalho à periferia pensando em um planejamento policêntrico utilizando-se de instrumentos vigentes no PDE como adensamento, descentralização administrativa, garantia da função social da propriedade e IPTU progressivo. Em contrapartida, candidatos que continuam promovendo um desenvolvimento segregado, com construção de moradias nas periferias sem pensar na qualidade de vida dos futuros moradores dessas habitações e seus acessos à serviços e infraestrutura, ou flexibilizando instrumentos do PDE importantes para equilibrar interesses do mercado imobiliário, como o caso de Joice, Levy Fidelix e Sabará, respectivamente, foram mal avaliados com base nos princípios de nossa agenda.
Pensar na política urbana também é considerar dinâmicas intramunicipais, em outras palavras, pensar nas relações da cidade com os municípios vizinhos em sua área metropolitana. Russomano, Tatto, Boulos e Helou apresentaram as melhores propostas para abordar os desafios e oportunidades para melhorar a integração e complementação das políticas de mobilidade na região.
Justiça social
As candidaturas com melhores avaliações nesse tema foram Boulos e Tatto (empatados) e Helou. Os planos de governo com melhores avaliações diagnosticaram os problemas que impactam grupos sociais vulneráveis e apontaram soluções para incluí-la em processos decisórios e participativos, combater processos de exclusão e violências.
No eixo equidade de gênero e LGBTQIAP+, possuem destaque a proposta de Tatto para a criação de subsídios ao transporte da população LGBTQIAP+ e as propostas de Boulos que visam a criação de linhas e a efetivação do direito de embarque e desembarque em condições diferenciadas para mulheres e LGBTQIAP+. Ambos os programas têm propostas para a priorização no acesso a programas habitacionais por essa população.
Em relação à equidade racial, os planos das três candidaturas citadas continuam em destaque, com o acréscimo do programa de governo do candidato Silva. Boulos propõe a criação de um Fundo Municipal de Combate ao Racismo e anuncia a reconstrução da Secretária de Igualdade Racial, que foi um órgão importante de articulação de políticas e de geração de evidências racializadas.
Silva trata a questão racial como elemento estruturante do programa de governo, assumindo o compromisso com uma administração pública antirracista. Para isso, propõe a revisão de leis vigentes com o propósito de detectar e eliminar barreiras à mobilidade social de pessoas negras e à paridade racial entre técnicos e gestores públicos. A inclusão de pessoas negras nas equipes que irão compor a nova gestão também é preocupação de Boulos e Helou. A candidata assume o compromisso de que metade das secretarias municipais serão lideradas por pessoas não brancas.
O programa da candidata Vera Lúcia também merece destaque em relação à equidade de gênero, LGBTQIA+ e raça. No entanto, apesar do diagnóstico realizado, não há propostas concretas para lidar com o desafio.
Apesar de não ter atingido pontuação máxima, merece destaque a proposta do programa de Matarazzo para o cuidado integral da população indígena, em articulação com as secretarias de saúde, educação e meio ambiente.
A relação entre velocidade veicular e infância é abordada no programa de governo de Tatto, que também demonstra preocupação com a acessibilidade de equipamentos de ensino. Os programas de Boulos, Helou e França também se destacam ao propor a melhoria das acessibilidade e do acesso ao transporte para esse público.
Idosos e pessoas com deficiência são foco das propostas dos programas de governo de Matarazzo, Russomanno, Tatto, Hasselmann e França. Com destaque para o Programa “Periferia Acessível”, proposto por Boulos, e o programa “Transporte Escolar Acessível”, parte do programa do Matarazzo. Esses e os demais planos destacados enfatizam a necessidade de ampliar a acessibilidade em calçadas e travessias.
Gestão e Participação
A presença do cidadão em espaços públicos participativos é um direito previsto na constituição federal e essencial em uma democracia plena. Em São Paulo contamos com espaços participativos como conselhos, comissões e comitês, contudo, na temática da mobilidade urbana e das mudanças climáticas alguns destes espaços estão inativos, ineficientes e/ou inacessíveis para a população e a sociedade civil organizada. Neste tema, os candidatos melhor posicionados foram Boulos, com a maior pontuação, seguido de Tatto, Helou e Vera.
Russomanno e Helou trataram sobre o fortalecimento do Conselho Municipal de Transporte e Trânsito, CMTT. Boulos defende que a integração modal seja debatida com trabalhadoras e trabalhadores. Já Tatto propõe a descentralização da administração pública por meio da criação de agentes comunitários de trânsito alocados nas subprefeituras.
No que diz respeito à melhoria dos processos de gestão pública e governança, Russomanno defende o fortalecimento institucional da CET; Boulos prioriza a concentração do controle de todos os serviços na SPTrans; Tatto propõe a criação da Empresa Pública Municipal de Transporte Coletivo para a operação do sistema de ônibus; Vera quer recriar a Companhia Municipal de Transportes Coletivos, CMTC, com uma gestão coletiva entre trabalhadores e comunidade.
Saúde e meio ambiente
Um dos principais temas de saúde que se correlaciona à pauta da mobilidade urbana é a qualidade do ar, devido às emissões de poluentes por veículos automotivos. Mesmo que, em São Paulo, mais de 10 pessoas morram por dia por problemas decorrentes do ar tóxico, o tema não aparece com prioridade nos debates entre os candidatos, assim como nos planos de governo. Na Região Metropolitana de São Paulo, os ônibus do transporte público são responsáveis por 25% dos casos de internações e mortes relacionadas à poluição devido ao uso do diesel como fonte energética. Nesse sentido, a Agenda Propositiva MobClima sugere que o próximo prefeito(a) realize esforços para avançar a licitação dos novos ônibus, já que a lei atual prevê a transição para uma matriz energética renovável.
Os candidatos que mais se destacaram neste tema foram Tatto, Helou e Russomano, que têm propostas no âmbito do controle e monitoramento da qualidade do ar. O tema não foi abordado por Sabará, Antonio Carlos e Vera.
No que diz respeito às propostas para a redução das emissões, Matarazzo e Boulos comprometem-se especificamente com ações para apoiar o processo de substituição da frota dos ônibus do transporte público. Helou é a única candidata a propor o retorno da Inspeção Veicular para controle das emissões.
Russomanno defende a aplicação de medidas de compensação com o objetivo de mitigar os efeitos da poluição. Helou defende uma integração entre redes de monitoramento municipal e estadual – contudo, vale enfatizar que ainda não existe uma rede municipal. Tatto defende a adoção de um sistema de indicadores de poluentes e a implantação de um sistema de informação regionalizado. Além disso, o candidato propõe a criação de uma política de metas para a melhoria das condições ambientais. Aqui vale apontar que o município já conta com inúmeros dispositivos legais que regem as pautas ambientais, contudo é necessário que a prefeitura se responsabilize por sua efetiva implantação.
Segurança viária
Apesar de a violência no trânsito ceifar pelo menos 700 vidas todos os anos na cidade, o tema recebeu pouca atenção dos programas de governo. Em relação às eleições de 2016, apenas Sabará e Levy Fidelix seguiram explorando o discurso populista e falacioso de “indústria da multa”.
Covas menciona o tema de maneira vaga, enquanto Boulos fala apenas em manter a política de redução de velocidades. A redução também aparece no programa de Helou, que aposta no estabelecimento de “metas rígidas” de redução de vítimas da violência no trânsito e cita o Plano de Segurança Viária, apresentado ano passado pela Prefeitura. Matarazzo, por sua vez, propõe ações de acalmamento de tráfego, que busca eliminar situações de risco no formato das ruas – o que se conecta com o princípio da Visão Zero, que foi prometida no programa de Joice. Por fim, Tatto, que apresenta propostas mais próximas da agenda, além de abordar o acalmamento de tráfego, propõe readequar o tempo de travessia de ruas para pessoas com mobilidade reduzida e reformular a educação no trânsito.
Mobilidade a pé
Nesse tema, os candidatos que mais se destacaram foram Tatto e Matarazzo. Ambos propõem programas para promover a acessibilidade universal nas calçadas e adequação dos tempos de travessia às necessidades de pessoas com mobilidade reduzida. Matarazzo propõe também arborização e ações de acalmamento de tráfego, enquanto Tatto fala de iluminação pública nas calçadas, além de colocar a prefeitura como responsável por melhorar essas estruturas em áreas periféricas.
Em seguida aparecem, empatados, Boulos e Helou. Ambos trazem propostas para acessibilidade parecidas com os primeiros colocados, mas não abordam a questão dos tempos de travessia. Boulos cita a implantação de semáforos sonoros para pedestres com deficiência, já Helou propõe ampliar áreas preferenciais de pedestres em centros de bairro. Covas e França aparecem em seguida, também apontando para a intenção de investimento público nas calçadas, com o destaque para a proposta de instalação de banheiros públicos trazida pelo último.
Mobilidade por bicicleta
Diferente das últimas eleições, quando as estruturas cicloviárias foram pontos de divergência pautando candidatos contra e a favor, nesta eleição, com exceção de Arthur do Val, Levy Fidelix e Antonio Carlos, o transporte por bicicletas e a estrutura cicloviária estão contemplados em quase todos os planos de governo. Os destaques são: Tatto, que propõe a ampliação de 500 km de ciclovias, como previsto no Plano de Mobilidade Urbana de 2015 (PlanMob), priorizando as conexões, as pontes e as periferia; Helou propõe adotar o conceito de mobilidade ativa como “pilar estratégico” para diminuir as emissões na cidade de São Paulo; Boulos, que apesar de não apresentar metas, diz ser “radicalmente” a favor da mobilidade ativa, pedestres e ciclistas; e finalmente, Silva, para quem a construção de ciclovias deve pautar ampliação do acesso da periferia aos principais “bens da cidade”.
Matarazzo propõe consulta pública para a instalação de ciclovias, demonstrando desconhecimento do processo de participação ao qual o PlanMob foi submetido. É o mesmo caso de Russomanno, que aponta que o plano cicloviário deve ser elaborado “integrado” ao pedestre, sem trazer mais especificações. Já o candidato e atual prefeito Covas diz que, se reeleito, a cidade alcançará 650 km de estruturas cicloviárias. Contudo, se cumprir a meta que a atual gestão promete para esse ano, a cidade ultrapassa 670 km de ciclovias, ou seja, dá a entender que não haveria ampliação da atual malha cicloviária.
Em relação ao estacionamento para bicicletas e intermodalidade, Boulos propõe a instalação de bicicletários próximos às estações e terminais e que tenha integração com Bilhete Único. Matarazzo propõe bicicletários em terminais com maior fluxo e racks para transporte de bicicletas nos ônibus. Tatto e França apenas mencionam que esse tipo de estrutura deve ser ampliada.
Sobre políticas de incentivo ao uso da bicicleta, Tatto é o único que propõe a regulamentação do Programa Bike SP de 2017. Ideias de ampliação das bicicletas compartilhadas aparecem de diversas formas nos programas de Hasselmann, Helou, Tatto e do Val. Tattoo propõe que sejam uma política pública, Joice, que sejam transporte de massa, Helou que sejam integradas ao transporte público e Do Val que sejam um modelo de negócio.
Transporte coletivo
O transporte coletivo enfrenta uma crise histórica de perda de passageiros, falta de financiamento e gestão precária. A exigência de distanciamento social exigida pelo novo coronavírus está ampliando esta crise e, por isso, a nova gestão deverá tomar medidas bastante efetivas e profundas de incentivo e priorização do uso do transporte coletivo.
Nesse sentido, Jilmar Tatto, Matarazzo, Covas, Russomanno, Boulos, Helou e Orlando possuem propostas corretas para aumentar a priorização dos ônibus nas ruas e avenidas com novos corredores de ônibus. Cabe destacar que Matarazzo, Russomano e Tatto falaram também da importância das faixas exclusivas de ônibus, que são infraestruturas mais baratas e rápidas de se construir considerando a restrição orçamentária e urgência que a Pandemia trás. Como destaque negativo neste tema, Andrea Matarazzo propõe a remoção de corredores da cidade, alegando sobreposição com o Metrô, o que se prova incorreto ao se constatar a ocupação dos ônibus nos corredores da cidade e prejudicaria os usuários, incentivando o uso de carro nestas avenidas. Em outro tema importante da infraestrutura dos transportes, a informação ao usuário nos pontos de ônibus, Helou é o destaque positivo por ser a única candidata a abordar este tema em seu plano de governo.
Em relação à qualidade do transporte coletivo, a maioria das propostas foram genéricas e esqueceram que um novo contrato para o serviço de ônibus, com novos instrumentos para a gestão, foi assinado recentemente. Tatto e Boulos mencionam o contrato, propõem corrigir alguns de seus erros para aprimorar o controle sobre o serviço prestado pelos empresários. Russomano, Matarazzo e Sabará apostam na tecnologia para melhorar o controle, já Joice e Arthur falam de instrumentos que iriam melhorar a seleção de empresas e a competitividade, mas sem mencionar como fariam isso, já que o contrato está assinado. Sobre o Bilhete Único, Boulos e França propõem ampliar o tempo de integração, o que corrigiria a redução adotada pela atual gestão.
Quanto ao tema da tarifa e financiamento, essencial para a continuidade do serviço de ônibus na cidade e para redução da tarifa cobrada do usuário, Márcio França, Boulos, Tatto e Matarazzo são os únicos que propõem a busca de novas fontes de receitas para o sistema.
Por fim, para combater o assédio sexual contra mulheres e a população LGBTQIAP+ no transporte público, Helou, Tatto e Boulos propõem a criação de políticas públicas ou campanhas dedicadas ao tema, garantindo o direito e segurança de todos as pessoas que utilizam o transporte coletivo.